Tudo começou pela suspeita (talvez exagerada) de que os Deuses não sabiam falar. Séculos de vida fugitiva e feral tinham atrofiado neles o humano; a lua do Islã e a cruz de Roma tinham sido implacáveis com esses prófugos. Testas muito baixas, dentaduras amarelas, bigodes ralos de mulato ou de chinês e belfos bestiais mostravam como degenerara a estirpe olímpica. Os seus atributos não correspondiam a uma pobreza decorosa e decente, mas ao luxo maligno das casas de jogos e dos lupanares do Bajo. Numa botoeira sangrava um cravo; num saco justo adivinhava-se o vulto de uma adaga. Bruscamente sentimos que jogavam a sua última cartada, que eram manhosos, ignorantes e cruéis como velhos animais de presa e que, se nos deixássemos tomar pelo medo ou pela pena, acabariam por nos destruir. Tiramos os pesados revólveres (de súbito apareceram revólveres no sonho) e alegremente demos morte aos Deuses.
Autor: Heine, Heinrich
Editora: Iluminuras
ISBN: 9788573211801
Ano: 2009
Edição: 1
Páginas: 168
Encadernação: Brochura
Formato: 14 x 21 x 0.9 cm